domingo, 20 de dezembro de 2009

Um belo cartão de Natal - a ser partilhado

Cartão de Natal da Marcia Cardeal, de Brusque - SC


Para se conhecer esta artista plástica e educadora de mão cheia acessem:

Por fim, FELIZ NATAL!

domingo, 30 de agosto de 2009

Desmandamentos

Os Desmandamentos, por Geraldo Carneiro e Salgado Maranhão

(Este manifesto se rebela contra a banalização indiscriminada da poesia e a palavra aviltada pelos demagogos, e é dedicado aos que julgam que ela não é passatempo de diletantes, mas artigo de primeira necessidade.)

1- Mais uma vez virou moda dizer que a poesia agoniza, ou que a poesia morreu. E de fato ela sempre esteve morta para os não-poetas. E morreu também com Homero, com Dante, com Camões, com Baudelaire, com Drummond e com tantos outros, porque cada poeta é uma via, um beco sem saída. E a poesia é sempre plural: é o lugar dos paradoxos (viva Shakespeare!), do não-senso (viva Lewis Carroll!), mas também é o lugar da verdade. Quanto mais verdadeiro, mais poético, como dizia Novalis. Mesmo quando um poeta faz as suas conficções, acaba em verdades metafóricas. E, nestes desmandamentos, afirmamos que a poesia, quanto mais remorre, mais renasce.


2- É a linguagem que produz a realidade e a poesia. A poesia não tem camisa-de-força conceitual. Aos funcionários públicos da vanguarda, que se acham herdeiros do legado, ela finge que se dá, mas é só o discurso vazio do chefe da repartição.


3- A poesia é um problema sem solução. Felizmente. Ninguém tem a fórmula mágica, ninguém tem respostas para todos. Cada leitor que invente o seu mundo, e o desinvente a seu bel-prazer. Semelhante à culinária, cada qual que ache o seu tempero. Se for significativo, o erro vira estilo. Ou vice-versa.


4- A poesia pode tudo, só não pode ficar prosa ou senhora da razão. O novo não é reserva de mercado, nem nasce a priori. Há que se romper limites, correr riscos, ter lucidez na loucura. Mesmo que seja pelo avesso. (E, cá entre nós, não adianta ficar o tempo todo buscando o absoluto, porque isso já ficou obsoleto. Ao fim de tantos levantes, sejamos, também, irrelevantes.)

5- A poesia não é para quem a escolhe, mas para quem recebe o choque elétrico da linguagem. Não é poder ou privilégio, é um defeito que ilumina. Não vale transporte, não vale refeição, não vale copiar truques ou seguir tutores. Nem apelar, como os demagogos, para o amanhã. Mesmo porque já não há mais Canaã no Deserto dos Sinais.


6- Poema não é cadáver. É um artefato musical que sempre canta, mesmo quando tem horror à música. Quem busca entender o poema apenas cientificamente, dissecando sua morfologia como quem faz uma autópsia, perde a viagem. Conhecê-lo é entrar em seus labirintos, sem separar o corpo de sua subjetividade.


7- Não queremos a poesia prisioneira de uma única arte poética. Seremos clássicos e barrocos; pós-modernos e experimentais. Qualquer tema é e não é poético. Desde os pit-boys de Homero até a aspirina de João Cabral. Com talento, mesmo as formas antigas podem ser recicladas. Sem talento, nem com despacho na encruzilhada.


8- As influências, em geral, são bem-vindas, a não ser quando alijam a voz própria. Há poemas com tantas citações que, se extrairmos o que é dos outros, não sobra bulhufas.


9- Os conchavos e panelinhas fazem parte da natureza humana. Cada grupo tem o direito de inventar os seus heróis, para admirar a própria imagem no seu espelho narcísico. Mas o vôo do poeta é só dele e, sobretudo, da linguagem. A linguagem é o orixá, o poeta é o cavalo do santo. Ninguém é mais do que o que pode ser.


10- O problema da poesia não é só fazer bem feito, mas fazer distinto (no duplo sentido, que implica tanto em diferença, como em elegância). Ela é um exercício vital para manter o vigor da palavra. A poesia não é só questão de verdade, mas de vertigem. Por essas e por outras, é que somos poetas da vertigem: vertigem-linguagem, vertigem-vida.


Último desmandamento:

Pode jogar no lixo todos os desmandamentos anteriores, a não ser que haja sinceridade na poesia. Quem quiser adorar bezerro de ouro, que adore; quem quiser viver de pose, que mantenha sua pose. Mas que haja espaço e fé na poesia. E que ela continue a fabricar futuros, e, como fênix, se destrua e se reconstrua por toda a eternidade e mais um dia.

Fonte: http://oglobo.globo.com/blogs/prosa/posts/2009/08/01/os-desmandamentos-por-geraldo-carneiro-salgado-maranhao-210136.asp

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Todas as palavras - um sítio onde se pode encontrar palavras...







Ajuda Online para resolver Palavras Cruzadas. Dicionário de palavras. Jogos de palavras!

Estive no Todas as Palavras e me foi útil.

Eu procurava uma palavra que pudesse meter medo e que terminasse em inho. Achei lá. Vizinho. E mais um punhado de outras.

Assim pude dar uns bons retoques na narrativa Os medos do João.



segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Gabo, Gabito, Gabriel Garcia Marques

O mundo virtual e seus labirintos hipertextuais nos conduzem a caminhos nunca dantes vistos. Ao seguir por suas trilhas podemos, pois, reunir e combinar fragmentos de informações coletadas aqui e ali, que se tornarão textos. O resultado pode ser pequenos posts ou escritos mais extensos.

Dito isso, podemos dizer o motivo que nos leva a escrever sobre o autor de Cem Anos de Solidão: simplesmente desejamos transcrever o post de Saramago, publicado ontem, 2 de agosto/2009, em seu diário virtual (cuja coletânea se tornará livro)

Antes, porém, de fazê-lo convém comentar brevemente sobre a autobiografia do citado escritor colombiano, anunciada como "volume um" de uma trilogia: Viver para contar.

Esta portentosa e impressionante obra nos revela algo que eu suspeitava e o Mário Prata tão bem sintetizou: "Lendo sua vida real, vemos que a sua ficção é muito pouco ficção". E isso incluiu os habitantes que nem permanecem, nem se vão completamente, tão bem descritos pelo Gabito: os espíritos, fantasmas ou outro nome qualquer que se lhes atribua.


O assombro que Gabo causa com o seu "realismo mágico", presente em maior ou menor grau em suas obras também fez Saramago perder o fôlego. Pois vamos ao que ele escreveu:

Gabo

Os escritores dividem-se (imaginando que aceitem ser assim divididos…) em dois grupos: o mais reduzido, daqueles que foram capazes de rasgar à literatura novos caminhos, o mais numeroso, o dos que vão atrás e se servem desses caminhos para a sua própria viagem. É assim desde o princípio do planeta e a (legítima?) vaidade dos autores nada pode contra as claridades da evidência. Gabriel García Márquez usou o seu engenho para abrir e consolidar a estrada do depois mal chamado “realismo mágico” por onde logo avançaram multidões de seguidores e, como sempre acontece, os detractores de turno. O primeiro livro seu que me veio às mãos foi Cem anos de solidão e o choque que me causou foi tal que tive de parar de ler ao fim de cinquenta páginas. Necssitava pôr alguma ordem na cabeça, alguma disciplina no coração, e, sobretudo, aprender a manejar a bússola com que tinha a esperança de orientar-me nas veredas do mundo novo que se apresentava aos meus olhos. Na minha vida de leitor foram pouquíssimas as ocasiões em que uma experiência como esta se produziu. Se a palavra traumatismo pudesse ter um significado positivo, de bom grado a aplicaria ao caso. Mas, já que foi escrita, aí a deixo ficar. Espero que se entenda.

http://caderno.josesaramago.org/


Imagens e palavras...

A editora Penguin, de Londres, é famosa tanto pelos seus pinguins estilizados, suas edições de bolso e por constantemente sair à frente das demais com ideias fora do padrão convencional.

Septuagenária, esta casa de livros inovou em lançar obras com preço acessível e "elegância tipográfica", além de ter criado uma máquina que cuspia livros - o "Penguincubator" - acionado por uma moeda de 6 pences (um valor irrisório).

Este preâmbulo conciso é para situar-me e aos leitores quanto à editora que lançou a bela sequência fotográfica abaixo, à qual ouso casar um poema meu:

O valor da palavra

Dou-te minha palavra
Que uma imagem vale
Quantas palavras
Puder expressar.

Devolvo-te em palavras
Expressas em números
Desses que podem ter
Qualquer valor
(Caso me engane)
Que nada vale mais
Que o próprio valor.

Ora, se o valor em si
Está expresso
Naquilo que o contém
Palavra e imagem
Equivalem-se.

A despeito da lógica
Convenhamos:
Existe algo melhor
Que trocar certas palavras?

Pode-se contestar
Que o valor intrínseco
Do que se troca
Não é igual.
O que vale dizer:
Dá-se lucro ou tem-se prejuízo.

Para finalizar reafirmo
No mais perfeito e são juízo:
O que se dá, multiplica-se
O que se retém, se esvai
Se a imagem não é perfeita
O remendo com palavras se faz.

É isso.
Abel Sidney

domingo, 2 de agosto de 2009

Poema também é para essas coisas...

Sabe aqueles erros que poderiam ter sido evitados se...

...tivéssemos sido mais prudentes, mais diligentes (zelosos, cuidados, aplicados, ativos, e portanto, menos preguiçosos e levianos)...

Pois é, diante da dificuldade de mudar velhos e arraigados hábitos vamos colhendo dissabores, sem necessidade.

Não vou submeter os meus ocasionais leitores aos meus problemas pessoais, pois não farei deste espaço um confessionário.

Mas podemos, poeticamente, cuidar disso, pois a poesia pode propiciar reflexões que transcendem os limites do nosso adorado umbigo, transmutando o "meu" em "nosso"...

Assim fiz nos poemas abaixo e no próximo que farei, sobre as pedras de tropeço já vistas, antevistas e ainda assim pisadas, chutadas para infelicidade do nosso pobre e desprotegido dedão:

A vida e a arte
- Escrevo melhor que sou
Dizia, humilde, o velho poeta.
Eu concordava, mudo.
- A poesia eu reescrevo,
Lapido, dou polimento...
Quanto a mim:
Para mudar
Uma só velha mania
Quantos anos levei!
Este sorriso que você vê,
Há décadas ensaio.
Não como ator, que finge
Mas como autor, que sou.
Se ele é hoje menos amargo
Custou-me muitas lágrimas.
Ainda dizem que a vida imita a arte!
A arte é que deveria meter-se na vida
E dominá-la, submetê-la...
Alguns não resistem a ela
E se entregam: esses são os grandes.
Conversa encerrada. Eu, mudo.
Assino embaixo.

Pendências

Não desejo deixar mais nada pendente:
Nem pingente, nem roupa seca tomando poeira no varal...

Recolher a todo instante o que esvoaça
E roçando passa promovendo atrito,
Pois manter pendências é exatamente isto:
Deslocar legiões de fantasmas a nos assombrar
Como as lembranças fugidias, das quais tentamos em vão escapar...

Estou fazendo devassa, levantando tudo o que vaga
Pelas paredes sujas, pela bagunça das gavetas
Pelo sótão da memória bem abarrotada
De quinquilharias não devolvidas
De promessas feitas e jamais cumpridas

Desejo agora tão somente o que possa
Dar firmeza e rumo ao chão:
Pedras soltas em meio aos dormentes
Destes feitos com madeira de lei
Para melhor assentar os trilhos
E poder seguir viagem...

E pensar que por deixar pra trás tanta coisa
Que tinha ou devia fazer
Que tudo fosse virar poema, ocupando a leitura alheia!

Por tudo o que seja sagrado, peço pois a meu leitor:
Não deixe nada pra depois e nem adie o que fazer!!

Por fim, buscando rima para finalizar este poema
Algo que rime com Bandeira Nacional – digna de ficar pendente
Nos postes, nos mirantes, ao alto, tremulante,
acabei, agora, por encontrar em meio às lembranças
uma frase simples, talvez apenas pra mim especial:
“Quando cumprimos à risca todos os deveres
O sentimento que brota no coração é tão compensador
Que nada no mundo se torna igual”....

Breve surto poético II - 26 abril 2007 (revisto hoje)

sábado, 20 de junho de 2009

Reflexões oportunas

Saiu mais um número do informativo online do Correio da Unesco (acesse aqui.).

O tema em foco é a diversidade cultural. Tenho lido aos poucos os pequenos artigos, que merecem ser degustados. Não é assunto corriqueiro que possa ser engolido às pressas, como fast food. É comida simples, mas que exige um ritual mínimo - sentar-se, acomodar-se, olhar o cardápio para as devidas escolhas, mirar à nossa volta, perceber o mundo que nos circunda...

De tanto retornar à mesma página acabei atraído pelo ícone aí abaixo,
com o título de UNESCO: atualidades, onde me deparei com a simpática submarina amarela e me informei:

Neste mês, o destaque das atualidades da UNESCO é o Patrimônio Cultural. A fim de sensibilizar crianças e adolescentes para o Patrimônio Cultural Subaquático, a Organização associou-se a «Dive Olly Dive!», uma série de desenho animado que relata as divertidas expedições de dois jovens submarinos que aprendem a navegar em um centro de pesquisa dos fundos oceânicos.

Enfim, eis que já se está a valorizar até o mundo subaquático e os seus tesouros (materiais e imateriais)...

Enquanto aqui, na superfície do nosso mundo periférico (particularmente Rondônia, na Amazônia Ocidental, Brasil), estamos ainda a buscar meios de explorar exaustivamente todos os recursos possíveis - naturais e humanos - para acumularmos bens de consumo de toda natureza, mas principalmente aqueles que deixarão a marca de "pouco durável" na esteira do tempo, impossível de tornar-se herança aproveitável às próximas gerações!!

Tanto mar, tanto mar... eis a distância a nos separar dos ideais da Unesco. Milhares de léguas a serem vencidas, a nos apontar o déficit educacional, que em muitos aspectos nos envergonha!

Quando ouvirmos alguns profetas de plantão, aparentemente loucos, nos falar da importância de educarmos as massas, de lutarmos por uma "educação pública de qualidade, democrática e gratuita" para todos (a despeito dos chavões de mau gosto), estejamos mais atentos, no mínimo!

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Crônicas e ensaios X

Cartola, um sonho


"E eu sei lá?! as rosas não falam..." Cartola

"Bate outra vez, com esperanças o meu coração / pois já vai terminando o verão, enfim..." Todos já ouviram alguma vez na vida esta canção. As rosas não falam, de Cartola, foi gravada por Bete Carvalho, Fagner, Gal Costa e outros intérpretes. Não estamos aqui, no entanto, para falar propriamente das rosas, mas de Cartola.

A vida e a obra dos grandes autores (escritores, compositores, etc) nem sempre se conjugam. Ora a vida suplanta a obra, ora a obra se destaca, apagando a vida. É raro haver uma perfeita sincronia e correspondência entre estes dois aspectos. Com o Cartola houve uma dessas raras conjunções.

Mas quem foi Cartola?, perguntaria alguém das novas gerações.

Angenor de Oliveira (1911-1980), nasceu no Rio de Janeiro e foi um dos fundadores da Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira. Sua vida foi marcada por muito sofrimento, motivado por doenças, ausência de reconhecimento à sua obra e problemas financeiros. De origem simples, trabalhou na construção civil e como usava um chapéu coco para proteger os cabelos do cimento que carregava na cabeça, ganhou o tal apelido.

Depois de fundar a Mangueira e compor sambas gravados pelos grandes intérpretes da época (Francisco Alves, Carmem Miranda e outros), aos 58 anos contraiu meningite. Sem outra alternativa, foi trabalhar como guarda e lavador de carros em um edifício em Ipanema. Sérgio Porto, cronista carioca da época, o encontrou tomando café num bar em uma madrugada, todo molhado. Estarrecido, prometeu e conseguiu ajudá-lo a sair daquela triste situação. O que comove, porém, é o depoimento dele, gravado em disco, acerca deste período de sua vida. Transparece aí toda a sua força e serenidade diante das intempéries da vida. O acontecimento é narrado sem qualquer mágoa. Com a palavra Aluízio Falcão, crítico e produtor musical: "Cartola não era uma pessoa queixosa, ressentida, como tantas que habitam o território da arte". Depois deste estágio como lavador de carros, voltou a compor e pode gravar o seu primeiro disco solo aos sessenta anos.

Nos anos setenta tornou-se proprietário de um restaurante no Rio, que evidentemente foi à falência, graças ao seu generoso coração e o seu pouco jeito com os negócios. Enquanto durou o negócio, o restaurante foi palco do reencontro dos brasileiros com o samba, que andava em baixa por aquela época.

Cartola deixou uma extensa obra, muito pouco conhecida, mas hoje felizmente revisitada por muitos intérpretes.

Alguém comentou um dia que Cartola não existiu, foi um sonho. Um sonho verde e rosa. Um sonho do qual não desejaríamos nunca mais acordar...

Seção Requentação (Porto Velho, 11 de novembro de 1998)

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Beirute, capital mundial do livro em 2009

Por meio da edição nº 4 da Correio da Unesco descobrimos que Beirute, capital do Líbano, foi eleita a capital mundial do livro deste ano pela Unesco.

Vale a pena a visita ao sítio, que tem na página introdutória uma sequência de fotos que divulgam as belezas naturais e culturais deste país-irmão, que é o Líbano.

Aliás, uma das virtudes da revista Correio da Unesco é nos apresentar informações sob um ponto de vista europeu (ou francês), mais amplo e diversificado do que o americano...

O Correio da Unesco

Recebi mala direta apontando para a revista Correio da Unesco, já objeto de comentário neste blog.

Além de recomendar a leitura, destacamos a presença nas matérias deste número de duas singulares mulheres, pertencentes a dois mundos bem diferentes, mas uma condição semelhante: são rainha e princesa em seus países e pertencem à geração de soberanas sensíveis às causas sociais, além de demonstrarem que engajamento pode se casar perfeitamente com beleza e sensibilidade...

Ei-las:



Princesa Laurentien dos Países Baixos (Holanda) e rainha Rania Al-Abdullah da Jordânia, respectivamente.

Saiba os motivos destas celebridades estarem frequentando as nobres páginas desta conceituada revista!


Na escola do futuro

Proteção do meio ambiente, respeito pela biodiversidade e defesa dos direitos humanos são temas que oferecem novas dimensões à educação. Desde seu lançamento, em 2005, a Década das Nações Unidas da Educação para o Desenvolvimento Sustentável se traduz por meio de iniciativas cujos ecos são apresentados nesta edição do Correio da UNESCO.

Clique aqui para ler a nova edição do Correio.

André Duarte e suas esculturas inspiradoras

É mesmo de ferro fundido, de aço?

André Duarte esteve na Espanha, tal como o bom poeta que citamos abaixo. João Cabral por lá fez poesia e nos brindou com este poema ímpar. André continua a nos encher os olhos e alma com a sua arte cheia de rigor e inventividade!

André trabalha com material reutilizado (reciclado tem outro sentido, conforme aprendi ainda há pouco em uma feira do conhecimento, na escola dos meus filhos). E sua carreira já aponta para muitos êxitos futuros, com todo mérito.

Vale uma visita à sua galeria virtual. Vá e se prepare para as boas impressões "a ferro e imaginação"!

Já o contactei para a liberação da imagem de suas peças, que bem caberão no material que estou produzindo sobre o nosso patrimônio cultural - o que inclui, é claro, a nossa Estrada de Ferro Madeira-Mamoré.

Bom feriado a todos neste Corpus Christi!

O Ferrageiro de Carmona

João Cabral de Melo Neto

Um ferrageiro de Carmona,
que me informava de um balcão:
"Aquilo? É de ferro fundido,
foi a forma que fez, não a mão.
.
Só trabalho em ferro forjado
que é quando se trabalha ferro
então, corpo a corpo com ele,
domo-o, dobro-o, até o onde quero.
.
O ferro fundido é sem luta
é só derramá-lo na forma.
Não há nele a queda de braço
e o cara a cara de uma forja.
.
Existe a grande diferença
do ferro forjado ao fundido:
é uma distância tão enorme
que não pode medir-se a gritos.

Conhece a Giralda, em Sevilha?
De certo subiu lá em cima.
Reparou nas flores de ferro
dos quatro jarros das esquinas?

Pois aquilo é ferro forjado.
Flores criadas numa outra língua.
Nada têm das flores de forma,
moldadas pelas das campinas.
.
Dou-lhe aqui humilde receita,
Ao senhor que dizem ser poeta:
O ferro não deve fundir-se
nem deve a voz ter diarréia.
.
Forjar: domar o ferro à força,
não até uma flor já sabida,
mas ao que pode até ser flor
se flor parece a quem o diga.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Não custa avisar, divulgar...

Recebi mala direta eletrônica da obra aí ao lado.

Além de útil, saltou aos olhos o baixo preço da mesma, em comparação com seus similares - mesmo número de páginas.

Livros mais em conta ainda é novidade (ou efeito de promoção) em nosso País.

Avaliem. Se comprarem, me emprestem.

A nova ortografia sem mistério
do ensino fundamental ao uso profissional

de Paulo Geiger e Renata de Cássia Menezes
Lexikon Editora Digital, 160 p., R$ 16,90
Formato: 12x17 cm
ISBN 978-85-86368-56-1

O único guia da nova ortografia a apresentar cerca de 4.000 palavras e expressões que mudaram em função das novas regras ortográficas

como eram e como ficaram

A nova ortografia sem mistério traduz na estrutura e no texto essa visão, desde o mais simples e geral até o mais específico, desde o conceito até a ferramenta, desde as regras até as próprias palavras. Com esse objetivo, A nova ortografia sem mistério é o único guia da nova ortografia a apresentar cerca de 4.000 palavras e expressões que mudaram pelas novas regras no dicionário. As palavras que mudaram foram selecionadas nos dicionários Aulete Digital ( www.auletedigital.com.br ) e no iDicionário Aulete ( www.aulete.com.br ), que têm 818 mil unidades de informação (verbetes, definições e locuções).

A nova ortografia sem mistério contém:

Cerca de 4 mil palavras e expressões que mudaram: como era e como ficou, um vocabulário que destaca e sintetiza as mudanças.

Explicação simples e acessível sobre a língua portuguesa, sua história e a questão da ortografia.

Uma historinha na nova ortografia.

Guia simplificado e comentado somente do que mudou no Brasil (uma ferramenta de rápido entendimento e fácil de usar).

Todo o Acordo em forma de tabela permite fácil visualização das regras, exemplifica, comenta e indica o que mudou e o que permanece.

O Acordo na íntegra, um documento para guardar e consultar.

Tudo isso num formato confortável para ter na mesa, na estante ou na pasta, para levá-lo consigo a qualquer lugar.


Os autores

Paulo Geiger, carioca, 73 anos, é designer e editor de obras de referência há mais de 40 anos, tendo contribuído com várias editoras, como a Editora Delta, a Encyclopedia Britannica, a Keter Publishing House (Jerusalám), a Nova Fronteira e a Lexikon editora digital. Entre as obras que coordenou e/ou editou, as enciclopédias Delta-Larousse, Barsa, Mirador internacional, Delta Universal, Judaica, Mundo da Criança, Novíssima Delta Larousse; e os dicionários Koogan Houaiss, Caldas Aulete (1985), Aurélio Século XXI, miniAurélio, Aurélio eletrônico, miniAulete, Aulete com a turma do Sítio do Pica-pau Amarelo, Meu primeiro Aulete, Aulete digital, iDicionário Aulete.

Renata de Cássia Menezes, carioca, 44 anos, é pesquisadora, lexicógrafa e lexicóloga desde 1988; especialista em etimologia e morfologia, trabalhou como pesquisadora e lexicógrafa para o mestre Antônio Houaiss durante 8 anos, há 15 trabalha para os dicionários Aurélio (Aurélio séc. XXI, Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, míni Aurélio, míni Aurélio Escolar, Aurélio Com a Turma da Mônica e Aurélio Júnior), há 4 trabalha para os dicionários Aulete digital e iDicionário Aulete.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Crônicas e ensaios IX


O mapa e o homem

"Quanto a mim:
Para mudar
Uma só velha mania
Quantos anos levei!"
                Trecho da poesia "A Vida e a Arte"

Surge de tempos em tempos novas teorias no campo da administração. A maioria prometendo soluções fáceis para velhos e difíceis problemas. Uma análise profunda, no entanto, nos levará a seguinte conclusão: a de que a aplicação de qualquer teoria e o seu conseqüente método tem como limite o próprio homem. O fator humano, a pessoa, é o ponto central do problema.

Como então aplicar as maravilhosas técnicas de administração do tempo, por exemplo, em pessoas cuja formação foi marcada pela indisciplina? Para que uma técnica ou um método qualquer seja aplicado com eficiência, seria necessário o pleno empenho da pessoa em reformular, em mudar velhos hábitos e costumes, o que implica, em última instância, numa nova concepção de vida. O que estimularia, no entanto, uma tal mudança? A perspectiva de melhores salários? A necessidade de manter-se no emprego? É óbvio que o homem se adapta sob pressão ou necessidade aos ambientes de trabalho mais hostis, principalmente sob a perspectiva de vir a perder o emprego. Não estamos tratando, porém, de casos extremos. Nós podemos afirmar, por outro lado, com convicção, que se não houver estímulos e motivações adequados e relevantes, não haverá mudança, transformação real, mas apenas adaptação forçada e provisória.

O ponto central de nossa tese é a que somente com a transformação do homem será possível mudar o mundo (a empresa, a escola, a família, etc). Aliás, existe uma história interessante sobre isto. Conheço-a em duas versões, mas em essência o que se conta é que um pai, extremamente ocupado com uma tarefa que levara para casa, não conseguia concentrar-se, pois a filha tagarelava ao seu lado. Para entretê-la, pegou um mapa mundi, recortou-o e entregou o 'quebra-cabeça' para que ela montasse. Qual não foi a sua surpresa, quando ela, cinco minutos depois retornou com o mapa todo montado. Intrigado, ele perguntou como ela conseguira tal proeza. A menina, muito tranqüila, respondeu que fora muito fácil, pois atrás do mapa havia a figura de um homem. Bastou recompor o homem e o mapa do mundo foi refeito.

Daí a importância da educação. Não a mera instrução, o simples treinamento voltado para o mercado de trabalho, que sabemos ser necessário. A educação integral é a que desejamos destacar. Aquela educação que preocupa-se em moldar um homem novo, mais solidário e responsável. Uma educação que preocupa-se com o raciocínio, o sentimento e o caráter. Enfim, teremos um imenso desafio no próximo milênio, por longos séculos, que é justamente a educação das massas. Se nada fizermos neste sentido, estaremos condenados a viver neste caos nosso de cada dia...

Seção Requentação (Porto Velho, 11 de novembro de 1998)

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Crônicas e ensaios VIII

Calendário

"
...se o calendário atrasar / eu faço voltar o tempo outra vez / tudo outra vez a passar" Fagner

Como se sabe, a indústria farmacêutica promove um saudável assédio aos médicos, por meio dos seus representantes. É através dessas visitas periódicas que são apresentados os novos remédios ou reforçado a imagem dos velhos. As famosas amostras grátis de remédio surgem desse contato. 

Além das amostras eles também ganham presentes de toda natureza: de almofada para carimbo a CD, de livros a relógios. Inclusive calendários. Muito bem, o que o tal calendário continha de original era apenas frases. Uma por mês, acompanhada de um desenho que a interpretava. É disso que trataremos. Eis as frases:

Janeiro: Jamais prive uma pessoa de esperança. Pode ser que ela tenha só isso.

Fevereiro: Cante no chuveiro.

Março: Aceite sempre uma mão estendida.

Abril: Saiba perdoar a si e aos outros.

Maio: Respeite todas as coisas vivas.

Junho: Saiba guardar segredos.

Julho: Assista ao nascer do sol pelo menos uma vez por ano.

Agosto: Aprenda a tocar um instrumento musical.

Setembro: Elogie três pessoas por dia.

Outubro: Tenha um aperto de mão firme.

Novembro: Gaste menos do que ganha.

Dezembro: Não reze para pedir coisas. Peça sabedoria e coragem.

Pode parecer filosofia barata, mas não é. Algumas podem pertencer ao gênero "dicas, truques e quebra-galhos", o que não elimina o seu valor. 

"Tenha um aperto de mão firme", por exemplo, é de fundamental importância nos nossos relacionamentos. Dizem alguns que aperto de mão frouxo revela insegurança ou timidez. Ou ainda descaso. Não é preciso, porém, quebrar os ossos alheios. É preciso saber dosar a própria força, convenhamos. 

As frases, por outro lado, proporcionam temas para que se escreva um livro. No entanto, fiquemos apenas com o mês de novembro e a sua sábia advertência: "Gaste menos do que ganha." O autor das frases, deve ter adivinhado que mais um capítulo da crise financeira internacional e brasileira iria nos encontrar em novembro com os bolsos vazios. Que dezembro seja melhor. E que rezemos menos pelos presentes que desejaríamos ganhar e mais pela sabedoria e a coragem que precisamos conquistar para seguirmos serenos, a despeito de tudo.

Seção Requentação (Porto Velho, 6 de novembro de 1998)

PS.: o ingênuo assédio da indústria farmacêutica aos médicos, relatado por mim, há quase dez anos, já caiu por terra... O calendário e as frases continua inspirando.

domingo, 31 de maio de 2009

Crônicas e ensaios VII

Como a classe média trata os seus filhinhos

"Sob o ditames da moda, do sucesso, do fácil, vamos criando um verdadeiro exército de imbecis - ricos, mimados, cruéis..." Pedro Garcia de La Vega

Conversava há poucos dias com uma funcionária do Banco do Brasil. Economista, professora universitária e mãe. Desde os doze anos todos os seus filhos trabalham. Meio período, com critério, mas também com rigor. Trabalho que em nada atrapalhou os estudos deles. Pelo contrário. Bastar ver que estudam em boas universidades, cujo acesso nunca é facilitado.

A sua filha, elas nos contou, dá-lhe hoje os créditos de mãe no sentido maior da palavra. Por reconhecer que os rigores, o 'autoritarismo' e as 'chatices' dela, foram fundamentais para o seu desempenho escolar e para a sua tranqüila vida de estudante. Ela lava, passa, cozinha, estuda (é claro) e sobrevive sem sobressaltos com menos de quatro salários mínimos. A sua colega de apartamento recebe praticamente o dobro e vive emprestando dinheiro. A primeira teve uma mãe que a educou verdadeiramente. Sem cair na cilada do 'coitadinha da minha filha'. Ou do 'tudo o que eu não tive, vou dar a ela'. A outra teve uma mãe que a protegeu, não a preparou para os embates naturais e saudáveis da vida e hoje ela não sabe se conduzir. Talvez aprenda com a colega, se tiver bom senso. Talvez.

Os pais devem ocupar os seus filhos. Trabalho remunerado, voluntário, doméstico, simbólico, o que seja. Porém os pais e mães da nossa decadente classe média teimam em protegê-los, livrando-os do trabalho... E a proteção é tanta que se transforma qualquer adolescente em fase de crescimento em criança de berço. Daí, talvez, o apelido deles: filhinho de papai, da mamãe, mauricinho, patricinha, etc.

O filhinho, ao contrário dos pais, que lutaram, trabalharam, suaram e venceram, não pode trabalhar. Ou se ocupar com alguma coisa útil. Pode ficar traumatizado. Ou ainda atrapalhar os seus estudos (como se alguém conseguisse estudar todas as horas do dia). Nada mais falso. Nada menos saudável. E as conseqüências, senhores, é bem sabido. Uma legião de rebeldes sem causa, sem rumo, sem a mínima disciplina, respeito e noção do que é viver em sociedade.

Muitos argumentam: eles não trabalham porque não encontram emprego. Mas que emprego desejam para os seus filhos? Evidentemente nada que se assemelhe aos que eles tiveram. Eles puderam ser disciplinados, aprenderam a respeitar hierarquia, cumprir horário e outras coisas nem sempre agradáveis mas necessárias. E agora, é de se pasmar, negam tudo aos seus filhos. Eles estão sendo privados de tudo isso. Do que é fundamental na formação de uma criança, adolescente ou jovem.

O que esperar? Que o Exército discipline o seu filho? Antigamente, quando o adolescente estava beirando as raias do crime, existia essa última esperança. Ele iria servir a Pátria e no quartel recebia o que em casa não lhe deram. Noções básicas de educação... E agora, o que fazer?

As meninas também estão sob as asas da proteção dos pais da nossa decadente classe média. Elas já não aprendem mais a trabalhar nas lides domésticas. Não se aprende a cozinhar, arrumar casa, lavar e passar, pois isso hoje é coisa de 'empregada' ou 'secretária'... Motivo? Quase sempre o mesmo: as oportunidades que eu não tive ou tive com muito sacrifício, darei aos meus filhos. De 'mão beijada', sem lhes dar pistas do que sejam as palavras esforço, sacrifício, luta. Essas oportunidades, desse modo, excluem a educação mais básica, aquela forjada na convivência, no espaço simbólico chamado lar, onde se aprende as noções fundamentais de convívio humano. E onde, o mais importante, aprende-se regras de conduta. Estas regras são assimiladas através de tarefas, responsabilidades e isso exige participação, trabalho. Nem que seja o mínimo, quando não haja possibilidades maiores: pelo menos que se lave as roupas íntimas, guarde-se os objetos de uso pessoal e coisas do gênero.

Espera-se que não se poupe tantos os filhos. Se poupança (monetária) nunca rendeu muito e aliás existe mais para preservar valores do que para ampliá-los, o que dizer do fato de se buscar a todo custo poupar os filhos dos embates da vida?!... Eles vão estagnar. Sem riscos, sem dor, sem luta, não há crescimento... Não existe investimento melhor para os nossos filhos, do que lhe darmos trabalho. Acreditem.

Seção Requentação (Porto Velho, 6 de novembro de 1998)

sábado, 30 de maio de 2009

Crônicas e ensaios VI

Os andaimes e os edifícios

"...a ilusão de que somos eternos neste corpo responde por muitas tragédias." Pedro Garcia de La Vega 

Um amigo engenheiro comentou comigo algo sobre a teoria dos andaimes. Ouvira de um colega, durante a construção de um grande edifício em São Paulo, lá pelos anos cinqüenta. Eu a resumirei, lamentavelmente sem a elegância com que ela foi contada. 

Eu já conhecia a palavra andaime. O seu significado e as várias formas de utilização, sempre me chamaram a atenção. Admirei-me, porém, ao descobrir que existia empresas especializadas em locá-las; enfim um insuspeito mercado de provisórios arranjos. Sejam feitos de madeira, de tubos de aço ou de qualquer outro material, os andaimes não permanecem indefinidamente nos canteiros de obra. São colocados ali para cumprir um objetivo passageiro. Após a conclusão da obra, ele é desmontado, reaproveitado ou deslocado para outro local. 

Muito bem, mas o que dizia a teoria dos andaimes do velho engenheiro? 

Que existe na vida humana duas coisas básicas: andaimes e edifícios. Os andaimes são os nossos corpos. Os edifícios simbolizam o nosso espírito em permanente estado de construção. Assim como é difícil perceber qual será a forma de um edifício em obras, quando os andaimes estão à sua volta, da mesma maneira pouco se distingue as nossas construções interiores (há mesmo pessoas que mal conhecem a si próprias, tão preocupadas estão com os seus andaimes). Curiosamente, alguns chegam a afirmar que o edifício em si, após um certo tempo, fatalmente desaparecerá. Naturalmente eles confundem andaime e edifício. Talvez acreditem que o ser more no corpo e nele se resuma. Não é de se estranhar, pois, que ao não se distinguir corpo e alma, as pessoas dêem mais importância ao que é provisório (ao andaime), do que ao que é eterno (o edifício que está permanentemente em construção). Como conciliar, então a estranha crença das pessoas no Grande Arquiteto do Universo (ou Deus) com a idéia de que removido os andaimes (o corpo) desmorone todo o edifício? 

Eu ouvia o amigo engenheiro, que se mostrava sinceramente entusiasmado com as divagações que um simples andaime permitia, quando o alertei que estávamos chegando ao nosso destino; que ele encerrasse o seu raciocínio. E ele o fez: "Que os andaimes sejam importantes, ninguém ousará negar. E o nosso corpo-andaime o é. O que se precisa e com urgência é deslocarmos nossa visão para a obra em construção. Aqueles que tem essa noção costumam cuidar muito bem do andaime, pois terá que prestar contas do seu uso, mais tarde. Mas em nenhum momento podemos deixar de estar atento à construção da obra ou à sua reforma." 

Despedi-me do amigo e seguimos nossos rumos. Se essa teoria se tornar corrente e nos perguntarem como estamos "tocando a nossa obra", o que haveremos de responder?

Seção Requentação (Porto Velho, 28 de outubro de 1998)

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Crônicas e ensaios V

Liga-Desliga

"Nem só de pão vive o homem..." Mateus (4:4)

Dia desses eu estava a conversar algumas trivialidades com uns amigos. Comentários despretenciosos sobre certas coisas da vida, algumas engraçadas, outras curiosas. Bate papo com os amigos precisam desses elementos. Muitas vezes é a partir de uma consideração sem maior importância, que nos aprofundamos em assuntos mais sérios. No meio dos citados amigos tinha uma criança. Menina inteligente e sensível, estava ali nos ouvindo, nos espiando. Pude perceber toda essa sua atenção, quando observou, minutos depois, roda desfeita: "oh tio, por que o senhor vive olhando para o tempo?"

Uma boa pergunta. Por que vivemos olhando para o tempo? Esse olhar o tempo, não era um olhar meteorológico, como aqueles que varrem o céu a procura de indícios de sol ou chuva. Era o olhar vago, depois que se perdem em horizontes distantes. Foi o que lhe respondi, ao acrescentar que deixara o meu corpo ali e estava passeando por aí. Que era uma maneira muito barata de viajar; que dessa maneira era possível exercitar a imaginação e outras bobagens mais. Eu ri. Ela também, embora levasse o assunto muito mais a sério. Contou que um colega seu na escola é também assim: "Ele fica uns dois minutos virado para a parede, olhando não sei o quê, depois volta e acorda. Eu pergunto, então, em que ele estava pensando e ele nunca sabe..."

Não sei se é comum a todos esses estados de desligamento, desprendimento. Ou será um estado de pensamento profundo? Um amigo nosso, dado a esses vôos, tem às vezes problemas conjugais graças a estas viagens. Ao voltar à realidade, é difícil explicar à sua esposa por onde ele esteve. 

Partilhar de viva voz o que trazemos de tão longe ou profundo é, às vezes, impossível, ou muito desgastante. É como viver uma experiência inédita, inusitada e tentar descrever para os outros o que se viveu, de imediato, sem que nos deixem descansar da jornada. Faltam-nos palavras. 

A despeito dos pequenos problemas que os estados de alheamento pode nos causar, esse olhar para dentro sempre nos faz bem. Os próprios aparelhos eletrônicos estão sendo programados para trabalhar assim, em stand by, em estado de quase dormência, mas de prontidão; um simples sinal de atividade e eles se reativam. Viver alucinadamente preso aos duros acontecimentos de cada dia, pode nos levar a sobrecargas que nos causam sérios danos físicos e psicológicos. Aprender a ligar-se e desligar-se, dessa maneira, é fundamental. O resto é imaginação, fantasia e sonho. O que recomendamos também nunca se dispensar.

Seção Requentação (Porto Velho, 28 de outubro de 1998)

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Crônicas e ensaios IV

Os perigos da arte

"A arte é perigosa para a imaginação e a sensibilidade" Paul Claudel 

Há sérias dúvidas se a arte ainda mereça um tal comentário, como o do Claudel, diplomata e literato francês. O poeta francês considerava essa uma vocação muito arriscada. Poucos resistiriam e acabariam numa vida frustada... Sua afirmação se baseava na vida de cão de sua própria filha Camille, que se tornara esposa do escultor Rodin e de outros artistas franceses do século XIX. 

Quem gostaria de ter um filho como Rimbaud, que aos dezoitos anos, um dos maiores poetas do seu tempo, precoce revelação, trocou literalmente a pena pelo fuzil? Seria o mesmo que tornar-se mercenário e/ou contrabandista de armas e ir lutar em uma das tantas guerras que ainda pipocam mundo afora. Foi o que ele fez, sabe lá Deus o porquê, levando consigo toda a sua poesia.

A própria Globo toma lá os seus cuidados com os jovens e velhos atores, principalmente com os primeiros. Especialistas ministram cursos de administração de carreiras, para que se evite os traumas e dramas que uma carreira bem ou mal sucedida pode acarretar. Disse mal ou bem sucedida, pois nem sempre as tragédias acontecem no ocaso ou no fracasso de uma carreira. O sucesso, por vezes, causa mais mal que o próprio fracasso. As alternâncias entre a evidência que o sucesso causa e o quase anonimato após esse mesmo sucesso, porém, parece ser a combinação mais difícil e perigosa de se administrar. 

É evidente que o artista, nas suas mais amplas variações necessita mais do que outros profissionais de equilíbrio emocional, para administrar sua vida, na breve ou longa carreira que tiver. Quanto mais efêmero e fácil o sucesso, maior deve ser esse prumo. Poucos resistem a um anonimato abrupto, depois de estar em evidência intensamente, às vezes, por tão pouco tempo... 

Outro grande perigo que vitima os artistas é o intenso e alucinado ritmo de trabalho que as produções e o mercado impõem. Não poucos se drogam para suportar as tantas imposições e pressões. 

É de se anotar também um outro fator de risco para aqueles que desejam se aventurar nesta vertiginosa vida. É o risco do sucesso instantâneo, passageiro e de qualidade duvidosa, que tem como complemento as fórmulas fáceis, com as embalagens que a mídia sabe tão bem vender. Os tantos grupos sertanejos ou de pagode são os exemplos mais cruéis da nossa indústria cultural. Primeiro por descaracterizarem o que seja sertanejo e pagode . Depois por serem, na maioria dos casos, meros joguetes das gravadoras. Por fim, é preciso considerar ainda o produto em si. Totalmente descartável. 

A super exposição a que estão sujeitos os homens que se tornam célebres e públicos, é também um grande mal. Invasão total de privacidade e transformação da pessoa em personagem, são alguns dos tantos efeitos colaterais desse gênero de sucesso. Que o diga a Xuxa. Ela sucumbiu ao peso da fama e segundo as análises mais apuradas ela deixou de ser pessoa, para tornar-se uma grife, uma marca, uma sombra... A gravadora do Skank, na contramão dessas tendências, está dosando a exposição do grupo mineiro na mídia, justamente para evitar o desgaste e as oscilações de mercado e público, como a que vitimou o RPM. Desde o crepúsculo do grupo que o Paulo Ricardo tenta, por todas as vias, voltar às estradas largas do sucesso...

Parece-nos que é necessário uma certa dosagem de raciocínio e bom senso nessas questões. E para se evitar as desilusões que acometem todos aqueles sonham voar mais alto que as suas asas permitem, é conveniente ter os pés no chão. E reservar uns longos anos para o amadurecimento da própria obra ou estilo. O tempo é sempre um bom conselheiro. Portanto, andemos devagar com o andor... 

Seção Requentação (Porto Velho, 28 de outubro de 1998)

domingo, 24 de maio de 2009

Um livro para pais e mães especiais...

Tenho um filho enquadrado como sendo portador de  TGD (transtorno geral do desenvolvimento) ou espectro autista. 

Já aprendemos a lidar com as tantas situações que os pais de filhos não-normais ou portadores de transtornos, síndromes, distúrbios enfrentam (sobram nomenclaturas e faltam "diagnósticos fechados" nesta área!).

Andréia Lígia é parceira de link de um outro blog nosso (www.conhecerparaprevenir.blogspot.com) e aí recebemos o convite de somarmos forças para divulgar este seu filho, digo, livro aí abaixo. 

Doutor, meu filho é normal?

Andréia Lígia V. Correia / Alana Cláudia Martins Mendes / Katherinne Rozy V. Gonzaga - 104 páginas - 1ª edição - 2009

O livro tenta quebrar a tão perigosa noção de que as nossas crianças não adoecem de transtornos psiquiátricos. Ele nos guiará a uma viagem sobre o comportamento infantil, estabelecendo limites para o normal e patológico, e quando procurar ajuda profissional. Revela algumas particularidades das relações familiares nesta faixa etária, alguns comportamentos que nem sempre são graves, como furto infantil, relação precária entre pais e filhos e a importância da família na saúde mental do pequeno. Transtornos mentais infantis são considerados com temas como Depressão, Autismo, Retardo Mental, Transtornos de ansiedade infantis, Fobia escolar, Pânico, Enurese e Encoprese infantis, e o famoso TDAH, dentre outros quadros, investigando causas, quadro clínico, modo de identificação e tratamento. Por fim, esclarecemos como ocorre o tratamento com crianças, desde o tratamento medicamentoso a algumas opções psicoterápicas, como a psicanálise e a ludoterapia infantil e abordagem psicoterápica nas escolas. O objetivo é, de modo simples, rápido, através de textos e casos clínicos, fazer com que os profissionais tenham um parâmetro de avaliação sobre os comportamentos infantis, quer sejam patológicos ou não.

Convite feito!

Crônicas e ensaios III

Que falta fazem as mães

"As mães não deveriam morrer nunca...Carlos Drummond de Andrade

Em 'Recordações da mamãe', simples papel manuscrito guardado na carteira, Drummond carregou por toda a vida os três pedidos feitos pela mãe: 

Não guardes ódio de ninguém;

Compadece-te dos pobres;

Cala os defeitos dos outros. 

Ele parece ter cumprido os desejos da mãe. Não consta de sua biografia que tenha tido inimigos. Se foi generoso com os pobres, não o sabemos. E se o fora, também, não teria dito, pois não era dado às indiscrições. Quanto aos defeitos dos outros, parece não ter tido tempo para o sinistro ofício de divulgá-los. 

Sua mãe, que mereceu dele um dos mais belos poemas sobre o tema, marcou-lhe por toda a vida. Ela alimentou-o com aquilo que os ladrões não roubam, nem roem as traças. Lições ternas e simples que fez questão de levar consigo pela vida inteira, manuscritas (a pequena síntese acima) e aquelas outras, impressas direto no coração. 

Nos seus primeiros escritos, o mineiro de Itabira escreveu que um anjo, desses que habitam o limbo, o teria inspirado e dito: 'Vai, Carlos, ser gauche na vida'. Numa tradução livre: "Vai, Carlos, não importa se pelas vias tortas, vá ser poeta na vida!" Ele foi. Mas desconfio que um outro anjo guiou-o. 

Esse anjo tem também o dom de permanecer nas sombras. Não as sombras do anjo torto, que é dado a estripulias; mas as sombras generosas que carrega consigo e que oferece, como um colo amigo, a quem necessite. 

Colo de mãe é assim: uma sombra, nos bravios ou longos estios da vida. Ela, mesmo à distância, nos acalenta e reconforta. Discreta e delicadamente nos aponta rumos, que nem suspeitamos existir. Quem tem olhos no coração vislumbra esses horizontes distantes. Por isso as mães quase sempre conseguem nos fazer distinguir as soluções para os problemas mais intricados. Essas indicações não nascem de meros raciocínios; nascem sim de um processo onde se misturam a intuição e todos os outros insuspeitados sentidos. Como o da premonição. Qual a mãe não é dotada desse extra sentido?

Por que estamos falando sobre as mães? Por um motivo simples: é que elas nunca fizeram tanta falta, como agora. Este último refúgio seguro, às vezes nos dá a impressão de estar em extinção. 

Devíamos fazer uma campanha para que se preservem as mães. Ou, de modo prático, que ajudemos a fazer nascer novas mães (e pais) mais conscientes do seu papel na formação integral dos filhos. Como filhos tornam-se pais, com a multiplicação das mães e pais responsáveis, teríamos em breve um mundo muito melhor, tão desejado por tantos. Não custa nada sonhar!

Seção Requentação (Porto Velho, 21 de outubro de 1998).      

sábado, 23 de maio de 2009

Crônicas e ensaios II

Inspiração

"Acabei de ter uma inspiração! Cadê, cadê?!..." Um escritor em busca de uma caneta

A inspiração e a intuição são sentidos ainda não digeridos pela ciência (e suas tantas vertentes). Deve haver um ou outro destemido estudioso, que a despeito dos preconceitos acadêmicos tem se debruçado sobre estes (extras) sentidos humanos. Curiosamente, são os jornalistas os que mais sondam o assunto. E assim mesmo, por via indireta, ao perguntarem aos seus entrevistados (artistas, geralmente) como se dá a criação de obras literárias, musicais, etc. Deste modo, pelas vias marginais, surge a inspiração como resposta.

A afirmação clássica do Thomas Alva Edison sobre a inspiração é típica do pragmatismo americano. E, não por acaso, é expressa matematicamente: a cada 5% de inspiração devemos acrescentar 95% de trabalho ou suor. A despeito da admiração pelo inventor da lâmpada e mil e outros inventos, discordo parcialmente dele.

O ponto central de nossa tese é que, sem defender a lei do menor esforço, há muitas ocasiões em que sem nenhum trabalho prévio, a inspiração nos dita o esboço completo de uma obra (músicas, contos, cenas, etc.). O trabalho nesses casos ocupa uma proporção muita acanhada em face da inspiração. Felizmente ninguém é visto como um artista menor por essa razão.

Suspeita-se que a inspiração costume freqüentar com mais assiduidade aqueles acostumados a um 'lento processo de elaboração interior', ou seja, uma constante ruminação dos temas de seu interesse. Mas não deixa, também, de visitar os distraídos ou ocupados com assuntos não relacionados com os sugeridos por ela.

A inspiração nos chega por meio de palavras, imagens e sons. A combinação destes três elementos (e outros que puderem existir) se transforma em idéia. Idéia clara, que por vezes mais se assemelha a um mapa, a um roteiro, prontos para serem utilizados. Ou uma idéia vaga, que nos cabe trabalhar, lapidar.

As mulheres e as mães, em particular, parecem ter este sentido mais apurado do que os homens. Sem contar um outro sentido, que é o da premonição. Quem não se lembra pelo menos de um fato em que uma mãe anteviu o que aconteceria a este ou aquele filho? E o pior: o alertou? Quantas vezes nós ignoramos estes avisos maternos e nos aconteceu alguma coisa?

Buñuel, o cineasta espanhol, em sua autobiografia, conta que o Chaplin se utilizava da inspiração para criar os seus filmes e suas trilhas sonoras. Ele dormia com um gravador ao lado da cama e acordava no meio da noite com as idéias prontas, que deixava gravado, para posterior exame. Foi assim que ele compôs a música tema de "As Luzes da Ribalta". Inspiração noturna e onírica. 

Vestígios, blocos inteiros, pequenas indicações, vagas imagens. Seja como for a apresentação ou a medida da inspiração, recomenda-se dar-lhe atenção. Tomando cuidado, é claro, para evitar-se captar ou receber "obras já existentes" ou de qualidade para lá de duvidosa. Separando-se o joio do trigo, é possível ampliarmos, deste modo, os nossos sentidos.

Sem trabalho e um certo talento, no entanto, a inspiração pode, quando muito, nos estimular. A nossa parte, do suor, cabe-nos fazer.

Seção Requentação (Porto Velho, 21 de outubro de 1998).